“A
minha segunda máxima consistia em ser tão firme e resoluto quanto
me fosse possível em meus atos e seguir as opiniões mais duvidosas,
desde que me tivesse decidido por elas, com constância não menor do
que se elas fossem exatíssimas. Nesse ponto, imitava aos viajantes
que, quando se veem perdidos numa floresta, não devem ficar errando
de um lado para outro, nem ficar, tampouco, no mesmo lugar, e sim
andar em direção tão reta quanto possível, acompanhando o mesmo
rumo, sem jamais desviar-se da direção tomada, por motivos fúteis,
mesmo quando, a princípio, o acaso tenha sido o fator que determinou
a escolha. Se, por esse processo, não atingem o local que desejam
atingir, chegarão pelo menos a um ponto no qual, com muita
possibilidade, se acharão melhor do que estando no meio da floresta.
Deste modo, portanto, como as ações de nossa vida nem sempre
permitem um adiamento, é uma verdade muito certa que não existindo
a possibilidade de diferenciar as opiniões mais verdadeiras, devemos
seguir as mais prováveis e, ainda que não vendo maiores
possibilidades em umas mais do que outras, devemos, entretanto,
resolvermo-nos por algumas e desde então não mais considerá-las
como duvidosas, na proporção em que se refiram à prática, mas
como muito verdadeiras e corretas, pois como tal deve ser tida a
razão que nos fez resolver por elas. Aí está o que até agora
permitiu que eu me libertasse de todos os remorsos e arrependimentos
que costumam agitar as consciências de certos espíritos débeis e
hesitantes que, na sua indecisão, se deixam levar a praticar como
boas as coisas que julgavam, anteriormente, más” .
René Descartes, Discurso sobre o método